Um ano depois da abertura do mercado de resseguros, o IRB-Brasil Re, que completa 70 anos
Um ano depois da abertura do mercado de resseguros, o IRB-Brasil Re, que completa 70 anos hoje, ainda responde por mais de 90% das operações do setor. Mesmo com a liderança isolada, o IRB não está parado. Busca parceiros estratégicos no exterior e está fazendo uma reestruturação interna, contou ao Valor o presidente do IRB, Eduardo Nakao. O mercado local foi aberto em abril de 2008 e já conta com quase 60 resseguradoras estrangeiras.
Criado pelo presidente Getúlio Vargas em 3 de abril de 1939 para fortalecer o mercado local de seguros, o IRB é hoje o maior ressegurador da América Latina e um dos 20 maiores do mundo. Em 2008, até novembro, registrou prêmios de R$ 3 bilhões. O balanço final do ano passado deve sair nos próximos dias.
Avesso a entrevistas, Nakao falou ao Valor, por meio de correio eletrônico, sobre o primeiro ano da abertura, o aumento dos preços do resseguro no Brasil e contou que, em tempos de crise, o IRB também está mais conservador e seletivo. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Valor: O IRB-Brasil Re faz aniversário no mesmo mês que a abertura do setor de resseguros completa um ano. Qual a avaliação do primeiro ano da abertura?
Eduardo Nakao: O primeiro ano de abertura ocorreu de acordo com as expectativas. Em 2008, os resseguradores que se cadastraram na Superintendência de Seguros Privados (Susep) consumiram a maior parte do tempo conhecendo as peculiaridades do resseguro no Brasil; as seguradoras, que são seus clientes diretos; e aqueles que serão seus principais segurados, em razão da especialização de cada um. Na realização de operações de resseguro, os resseguradores cadastrados atuaram em linhas de negócio selecionadas, de acordo com a especialização de suas sedes.
Valor: Depois de 69 anos de monopólio, como é atuar em mercado competitivo, com a presença de resseguradores internacionais?
Nakao: É estimulante, porém não chega a ser exatamente uma novidade. Quando detinha o monopólio, o IRB assumia todos os riscos do país e, por não poder retê-los na íntegra, por falta de capacidade financeira ou por razões de concentração de riscos, retrocedia o excedente para os resseguradores internacionais, em condições competitivas. Assim, disputar o resseguro oferecido pelas seguradoras, na presença de concorrentes, deixou de ser uma atividade desconhecida. Para completar, neste primeiro momento da abertura, os concorrentes, ao atuar com a precaução que deveria ser uma postura típica de todos os resseguradores, facultaram a prevalência da tradição do IRB.
Valor: Qual a expectativa para o segundo ano de abertura, que contará com mais resseguradores locais, como a Mapfre Re e a XL Re?
Nakao: Espera-se que o IRB-Brasil Re mantenha a sua função de principal player do mercado nacional. As seguradoras têm ciência de que, em qualquer situação, não deixaram de ser atendidas, e os segurados que cumprem todos os quesitos exigidos no contrato de seguro nunca deixaram de receber a indenização na ocorrência de sinistros, quando a responsabilidade do resseguro recai sobre o IRB-Brasil Re.
Valor: Para 2009, o IRB-Brasil Re se manterá com a fatia atual de 90% do mercado ou espera-se uma perda dessa participação?
Nakao: Quando o número de concorrentes aumenta, é natural haver uma queda de participação relativa de cada participante. Entretanto, o IRB-Brasil Re não vai mudar sua política de aceitação de risco para aumentar seu market share. Como o ano de 2009 vem com incertezas para os participantes da economia, as diretrizes do IRB estão mais rígidas, se comparadas àquelas praticadas em anos anteriores. Portanto, a estabilidade ou perda da participação relativa no mercado pelo IRB será determinada pelos cuidados que as seguradoras adotarão em sua atividade de subscrição.
Valor: Qual o impacto da crise financeira mundial nas operações do IRB-Brasil Re? O IRB está mais criterioso? Mais conservador e seletivo?
Nakao: A crise financeira por que passam quase todos os países determina uma política de subscrição com elevado grau de conservadorismo para os resseguradores, inclusive para o IRB-Brasil Re. A seleção de riscos torna-se mais rigorosa e sua aceitação, na solicitação de resseguro, passa a ser analisada com base nos efeitos esperados imediatos.
Valor: Os preços do resseguro subiram no Brasil como subiram no mercado externo?
Nakao: Sim. Em geral, seguradoras e resseguradores demandam um relacionamento de longo prazo. O segurado que respeita esta premissa terá sempre o respaldo do seguro, e a seguradora por ele selecionada terá todas as condições para proteger o patrimônio em risco diante de um ressegurador. Assim, uma elevação marginal dos prêmios já será observada no seguro e, consequentemente, no resseguro, na atual circunstância de falta de capacidade para a absorção de múltiplos riscos. Já os clientes que preferem a troca constante de seguradoras e de ressegurador, poderão, em determinado seguro, sofrer significativo aumento dos prêmios, por conta da resposta competitiva em ambiente adverso no curto prazo.
Valor: A reestruturação do IRB-Brasil Re, que começou a ser feita antes da abertura do setor, já terminou? O que falta ser feito e quais os próximos passos?
Nakao: Ainda não. Todos os passos para o IRB se manter competitivo no ambiente concorrencial já foram estrategicamente traçados e estão sendo implementados. Por exemplo, o banco de dados sistematizado, pronto para ser utilizado nos cálculos atuariais e no preenchimento de formulários a serem remetidos aos retrocessionários (resseguradoras que ficam com parte do risco) que dão suporte à carteira de riscos retidos, está na fase intermediária de sua implementação. O aspecto mais importante, no entanto, que é a mudança de cultura do quadro de pessoal próprio, já é uma etapa vencida e, portanto, os passos finais e definitivos para a consolidação de um ressegurador competitivo serão, agora, de fácil execução.
Valor: Em termos de profissionais, o IRB-Brasil Re precisa de mais gente? Como o profissional mais antigo se adaptou à abertura?
Nakao: Para acelerar o cumprimento das etapas necessárias para a consolidação de um IRB-Brasil Re forte e competitivo, uma das opções seria a de aumentar temporariamente o quadro de pessoal para, em um ou dois anos, reduzi-lo. O tamanho da redução prevista, após a finalização das tarefas hoje necessárias, deveria ser superior à elevação transitória, para que o número de empregados, no futuro, fosse menor que a dotação existente hoje. Mas, em se tratando de uma sociedade de economia mista, considero difícil avançar nesse sentido. Os empregados, antigos ou não, aceitaram o desafio de enfrentar a concorrência e estão sabendo utilizar eficazmente a experiência acumulada no período de monopólio, pela leitura nos documentos e o aprendizado correspondente, além da transferência de conhecimentos por tradição oral.
Valor: Qual a perspectiva para o mercado ressegurador em 2009, considerando a desaceleração da economia mundial e local?
Nakao: A perspectiva no ano de 2009 é de crescimento, sem significativo incremento nos riscos a serem concretizados. As empresas que buscam lucro sabem atuar em situações de crise econômica para maximizar o valor atual dos retornos esperados em anos subsequentes. Respaldado nessa tese e nas condições estruturais da economia brasileira, que tem espaços a serem ocupados pelas operações de seguro, tenho expectativa de crescimento da indústria de resseguro em percentual positivo superior a 5%.
Valor: O senhor declarou em 2008 que o IRB-Brasil Re iria buscar parcerias estratégicas operacionais no exterior. Houve avanços?
Nakao: Sim. O processo de formação de parcerias continua como meta estratégica da empresa. São parcerias sem qualquer mudança societária e, principalmente, sem concessão de exclusividade a qualquer ressegurador que mostre interesse na atuação conjunta, com regras previamente combinadas. Existem outros acordos operacionais sob exame na área técnica, preferencialmente em linhas de negócios que o IRB tem presença mínima como ressegurador. São acordos sem exclusividade e com intercâmbio de experiências, como dados históricos sobre as operações de resseguro no Brasil, acesso rápido e ampliado a seguradoras nacionais e análise de diluição de risco.
Fonte: Valor