Mercado de Seguros

Deflação em seguro de carros surpreende e gera ruído para BC

A queda vertiginosa nos preços de seguros veiculares nos últimos meses tem chamado a atenção de economistas, principalmente porque o item gera ruído em métricas acompanhadas de perto pelo Banco Central. Segundo especialistas do setor, o movimento é resultado de uma combinação de fatores e pode persistir à frente.

Só entre setembro e novembro deste ano, os preços do chamado “seguro voluntário de veículo” no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), inflação oficial do país, acumulam queda de 9,3%, observa o Barclays. Em 2025, até novembro, a redução é de 6,5%.

O problema é que os seguros de carros entram na conta dos serviços subjacentes, medida que engloba itens mais sensíveis à política monetária, o que não é exatamente o caso desses seguros, embora algumas das explicações para a deflação no segmento passem, sim, por questões envolvendo a desaceleração da atividade em um contexto de aperto monetário.

“Essa pegou o mercado de surpresa e acabou auxiliando na queda dos serviços subjacentes. Cerca de 10% [de queda] em três meses é bastante significativo”, afirma Alexandre Maluf, economista da XP.

Na média móvel trimestral anualizada e dessazonalizada (uma medida mais tendencial), a inflação dos serviços subjacentes está quase em 4%, dentro do teto de 4,5% para a meta de 3%, aponta o Barclays. Sem contar a ajuda dos seguros veiculares, porém, os serviços subjacentes ainda rodariam acima do limite, em 5,3%.

Os serviços subjacentes chegaram a superar 8%, pela média móvel trimestral, em dezembro de 2024 e passaram quase metade de 2025 acima de 7%. Excluindo os seguros veiculares, a melhora do grupo até novembro “teria sido muito mais modesta”, afirma Roberto Secemski, economista-chefe para Brasil do Barclays.

Economistas observam que, como a queda de quase 6% dos seguros veiculares no IPCA de setembro sairá do cálculo da média móvel trimestral no dado de dezembro, é possível que a diferença entra a medida de serviços subjacentes com e sem o item diminua, possivelmente levando os serviços subjacentes a interromperem a sequência de sete quedas consecutivas, por essa base de comparação.

Segundo especialistas do setor, a queda dos preços dos seguros de automóveis neste ano é resultado de uma combinação de fatores. Do lado da demanda, a restrição de renda tem levado os brasileiros a buscar coberturas mais simples. “Os clientes estão cotando mais e procurando alternativas de proteção, reduzindo a abrangência das apólices e contratando, por exemplo, apenas cobertura contra terceiros”, diz Gabriel Purkyt, sócio da consultoria BCG e especialista em seguros e instituições financeiras.

Do lado da oferta, o nível elevado da taxa Selic tem impulsionado os resultados financeiros das companhias e aberto espaço para políticas de preços mais competitivas. Parte relevante dos ganhos das seguradoras vem do resultado financeiro das aplicações, que tende a ser favorecido em períodos de juros altos. “As empresas, diante disso, conseguem reduzir as margens, já que o ganho financeiro está garantido”, diz.

O comportamento recente dos preços reflete também um processo de reequilíbrio do mercado, após um ciclo de alta entre 2021 e 2023, segundo Jaime Soares, presidente da Comissão de Seguro Auto da Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg). Naquele período, uma combinação de fatores pressionou os custos, como a escassez de peças, causada pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, a valorização do dólar e o aumento dos índices de roubo e furto de veículos.

“Com a normalização das cadeias de fornecimento, a maior estabilidade cambial e o avanço da tecnologia aplicada à gestão de risco, o setor imediatamente ajustou as tarifas, acompanhando a queda dos custos médios de reparo e a melhora dos indicadores de sinistralidade em algumas regiões”, explica Soares.

A sinistralidade vem se estabilizando em níveis mais saudáveis após o pico de 2022. O índice passou de 69,5% em 2022 para 58% em 2023 e 59,4% em 2024, o que, segundo o diretor da FenSeg, reflete melhor gestão de riscos, uso crescente de tecnologia e redução gradual de roubos e furtos em algumas regiões do país.

Além disso, o uso intensivo de dados e modelos analíticos mais precisos tem permitido às seguradoras calcular o risco de forma mais individualizada, considerando fatores como perfil do motorista, tipo de uso do veículo e localização geográfica. “Isso resulta em produtos mais adequados ao perfil de cada cliente, mantendo o equilíbrio técnico do mercado e contribuindo, de forma natural, para um cenário de menor pressão sobre os índices de preços ao consumidor”, diz Soares.

A explicação para a intensificação da queda em setembro, em particular, não é simples, mas pode estar relacionada a campanhas promocionais mais agressivas de algum participante do mercado, rapidamente replicadas pelos concorrentes, segundo Purkyt. Ele lembra que o segmento de seguro de auto é mais concentrado que outros ramos: atualmente, cinco empresas respondem por quase 80% das emissões. Com isso, qualquer movimento de corte de preços é sentido de forma imediata pelos demais players, observa.

No IPCA de setembro, o seguro de veículos registrou deflação de 5,98%, após subir 0,63% em agosto. Em outubro deste ano, a queda desacelerou para 2,13% e, em novembro, para retração de 1,46%.

A arrecadação do setor com seguro de automóveis cresceu 6,1% de janeiro a setembro, para R$ 45,2 bilhões, segundo dados mais recentes compilados pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg). A projeção é de aumento de 6,6% nesta linha em 2025 e de 7,7% no próximo ano.

Olhando à frente, Purkyt, da BCG, diz não ver fatores estruturais que indiquem reversão dessas tendências no curto prazo. “A dinâmica deve se manter pelo menos enquanto as taxas de retorno (ROEs) permanecerem elevadas”, afirma. Com isso, é provável que o movimento continue até pelo menos o fim do primeiro semestre de 2026.

Maluf, da XP, afirma ter incorporado, nas suas projeções de IPCA, como permanente a queda ocorrida nos preços de seguros veiculares até agora. “Parecia ser um efeito isolado, associado ao IPI verde [redução de imposto para carros mais eficientes]. No entanto, foram três leituras consecutivas de queda intensa.”

Ele ainda espera alguma devolução, com expectativa de crescimento de 0,75% no IPCA de dezembro. “O que eu quero dizer é que não tenho a volta de tudo”, explica. “Tenho que assumir alguma premissa. A queda foi muito forte em setembro, menor em outubro e muito menos intensa em novembro. A assimetria fica para normalizar um pouco, com estabilidade ou leve alta”, diz, sem descartar que podem acontecer novas surpresas baixistas. “Tudo isso ainda é um quebra-cabeça.”

Mesmo assim, a XP espera que o seguro veicular encerre 2025 com deflação de 5,8%, para um IPCA que deve subir 4,3%. Em 2024, o preço do seguro de carros no índice subiu 6,3%.

Fonte: Sonho Seguro – com informações do Valor

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