Primeiro trimestre pode indicar recuperação
A combinação de juros em baixa, real valorizado, preços das commodities elevados e a expectativa do primeiro crescimento trimestral do Produto Interno Bruto (PIB), depois de oito períodos consecutivos de quedas, podem fazer da temporada de balanços do primeiro trimestre o momento inicial da recuperação da economia.
A visão dos analistas é de que os lucros das empresas listadas devem crescer, na comparação anual, com base principalmente na melhora do resultado financeiro. O desempenho operacional também pode começar a dar sinais de melhora em setores ligados ao consumo interno, beneficiados pela inflação controlada e o saque das contas inativas do FGTS a partir de março.
A temporada de balanços começa hoje, com os dados da siderúrgica Usiminas. Com parte dos resultados vazados previamente, incluindo lucro líquido de R$ 108 milhões de janeiro a março, a empresa deve ser destaque no setor, junto à CSN, beneficiadas pelo aumento da demanda em aços planos. A Gerdau, líder em aços longos, ainda sofre, devido ao fraco desempenho da construção civil.
“No primeiro trimestre, já esperamos algum sinal de recuperação”, afirma o estrategista-chefe da Eleven Financial Research, Adeodato Volpi Netto. “Vamos começar a ver balanços um pouco mais leves no que diz respeito a resultado financeiro, porque muita empresa alavancada é beneficiada com o ciclo mais intenso de corte de juros”, completa.
Além da redução da Selic, outro fator a beneficiar a linha financeira das empresas é a valorização do real em relação ao dólar no primeiro trimestre. O dólar Ptax chegou ao fim de março cotado a R$ 3,17, abaixo dos R$ 3,26 de dezembro e dos R$ 3,56 de igual período de 2016. Com isso, dívidas na moeda americana vão pesar menos nos balanços.
Se, por um lado, o real valorizado ajuda na ponta financeira, por outro, deve prejudicar o desempenho operacional das exportadoras. O dólar Ptax médio do primeiro trimestre ficou em R$ 3,15, comparado a R$ 3,30 de outubro a dezembro e R$ 3,90 nos primeiro três meses de 2016.
As produtoras de celulose, no entanto, devem conseguir compensar parcialmente este efeito graças aos sucessivos reajustes de preços da pasta que vêm sendo anunciados desde setembro.
Já os processadores de alimentos, que tiveram resultado fraco no quarto trimestre, devem ter novamente números ruins, com o duplo impacto do câmbio e da fiscalização no mercado brasileiro de carnes, após a deflagração da operação Carne Fraca, na segunda metade de março, conforme destacou em relatório o analista Fernando Siqueira, do Citi.
Entre os exportadores de commodities, o destaque promete ficar por conta novamente da Vale, graças à valorização do minério de ferro e às iniciativas de corte de custos da empresa.
Apesar da queda de preços nas últimas semanas de março, o minério de ferro registrou uma cotação média de US$ 86 por tonelada no primeiro trimestre, comparada a US$ 71 de outubro a dezembro e US$ 49 no mesmo período de 2016 – o que representa um alta de preços de 76% na comparação anual, conforme dados do Itaú BBA.
“O minério de ferro tem caído um pouco ultimamente, mas, na comparação anual, no primeiro trimestre, está ainda muito acima do que foi há um ano”, observa Andrew Campbell, estrategista do Credit Suisse. “Foi isso que puxou o crescimento [da Vale] no quarto trimestre e esse fator deve se repetir no primeiro trimestre.”
A Petrobras também deve ser beneficiada pela resiliência dos preços do petróleo – o Brent teve média de US$ 55 por barril no trimestre, ante US$ 51 de outubro a dezembro e US$ 35 um ano antes. Embora o mercado interno de combustíveis continue retraído, o aumento na produção de petróleo na comparação anual deve permitir crescimento das exportações.
Para as companhias que dependem do mercado interno, as perspectivas positivas para o primeiro trimestre se baseiam nas expectativas dos analistas de um crescimento do PIB de 0,5% na comparação com o quarto trimestre, na série com ajuste sazonal – conforme a média de dez casas consultadas pelo Valor.
O Itaú BBA destaca que indicadores antecedentes apontam para um avanço mais disseminado do crescimento. “Além disso, a queda recente da inflação diminui a contração da renda real das famílias e o saque das contas inativas do FGTS estimula o consumo”, escreveu o banco, em relatório.
Embora o crescimento de receitas ainda deva ser contido, companhias que reduziram custos devem se beneficiar novamente de ganhos de margens. “Como as empresas têm feito muito o dever de casa, não dá para imaginar aumento de despesas gerais e administrativas, por exemplo. Temos tudo para entrar num ciclo de continuidade de margens melhores”, diz Lucas Tambellini, analista do Itaú BBA.
O Morgan Stanley projeta um “sólido” crescimento de 26%, 40% e 23% para receitas, Ebitda e lucro, respectivamente, das empresas brasileiras no primeiro trimestre, na comparação anual, considerados valores em dólares.
Analistas, no entanto, ainda recomendam cautela. “Diria que o mercado parece otimista demais com o ambiente de lucros para esse ano, dado que o primeiro trimestre ainda vai ser mais devagar e que será um processo de recuperação gradual ao longo do ano, e não de crescimento agudo”, diz Campbell, do Credit. (Colaborou Tainara Machado)
Fonte: Valor