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Estudo defasado vai afetar leilão de aeroporto

O leilão dos aeroportos de Salvador, Fortaleza, Florianópolis e Porto Alegre, previstos para março de 2017, deve ter o nível de atratividade impactado pela piora do ambiente econômico em relação ao cenário em que foram realizados os estudos de viabilidade aprovados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que datam de dezembro de 2015.

Empresários reclamam que a outorga mínima fixada repete ao menos um erro das rodadas anteriores: levar em conta cenário otimista que não deve se realizar. Os estudos que deram base à estruturação do edital davam previsões de tráfego para 2016 que dificilmente vão se concretizar e consideram um patamar para 2017 sobre o qual há considerável ceticismo.

Num cenário atual de queda na demanda de tráfego nos aeroportos até outubro, a perspectiva dos estudos é de que a curva de crescimento do volume de passageiros oscile de 2,6% em Porto Alegre a 4,9% em Salvador na média anual de 2017 a 2046, o que exigiria um ponto de inflexão no PIB previsto.

Para se ter uma ideia, as premissas macroeconômicas para os aeroportos de Fortaleza e Salvador incluíam previsão de crescimento de 0,2% do PIB em 2016 e de 1,7% no ano seguinte. O relatório Focus, do Banco Central, aponta para uma queda de 3,43% neste ano e um crescimento de apenas 0,8% em 2017. O tráfego do setor aeroportuário tem grande aderência ao comportamento do PIB.

“Ainda que o tráfego estimado estivesse certo, a curva de crescimento é pré-crise”, afirma uma fonte, para quem o governo, depois de tanto tempo refinando os estudos, não mudou o ponto nevrálgico. “Adaptaram dentro do limite do que podiam fazer. Sondaram muito mais o apetite do mercado [para lançar os editais agora] do que adaptaram os números à realidade”, afirma uma fonte.

A avaliação é de que a redução de outorga que aconteceu entre a divulgação inicial e a publicação do edital, na casa de R$ 1 bilhão, não contemplou essa questão, uma vez que aconteceu para compensar principalmente o pagamento que as concessionárias terão de fazer para custos de adequação de pessoal da Infraero, e a alocação do risco de desapropriação.

“Por isso a avaliação de que os preços estão altos, porque estão baseados em uma estimativa de demanda que provavelmente não vai se concretizar”, disse Bruno Werneck, sócio da área de infraestrutura do Mattos Filho.

Empresas e assessores não chegam a achar que isso inviabilizará a realização do leilão, mas acredita-se que os ágios devem ser menores que o potencial. Nesse momento, os interessados estão debruçados sobre os editais que foram publicados na semana passada para saber qual lance podem dar considerando suas próprias previsões de demanda e, portanto, de curva de tráfego e possíveis otimizações de custos.

Renato Sucupira, sócio da BF Capital, uma das empresas que fez os estudos para Porto Alegre e Florianópolis, admite que o cenário base então era melhor. Ele concorda que o ideal seria ter atualizado os estudos para o lançamento do edital, mas pondera que isso atrasaria bastante o processo. Apesar do potencial de ágio menor, a avaliação preliminar da BF Capital é de que os ativos permanecem atrativos.

Essa defasagem pode fazer com que empresas comprometidas em dar “lances responsáveis” não possam elevar a oferta muito acima do preço mínimo fixado, que totaliza R$ 3,01 bilhões para Porto Alegre, Florianópolis, Salvador e Recife.

Soma-se a essa divergência na largada a incerteza quanto ao tempo da recuperação da economia e ao cenário político. “Se o Temer cair, nem leilão teremos”, disse, sob condição de anonimato, uma fonte. O risco é de que a turbulência política e sucessivas revisões para baixo de estimativa de desempenho da economia brasileira deixem a distância entre projeção de tráfego e realidade ainda maior em março de 2017.

“Aeroporto tem muita atratividade, é um setor muito bem visto pelos ´players´ de infraestrutura. Agora, acho que dado o cenário do Brasil, todas essas incertezas políticas, as delações da Lava-Jato, geram uma instabilidade grande. Não vai ser uma corrida ao ouro. Creio que vai ter muita decisão sendo tomada na véspera”, diz um interessado.

Para Daniel Uzueli, diretor da Astris Finance, butique internacional de assessoria a investidores em infraestrutura, a falta de criação de mecanismos de proteção cambial ou indexador cambial para investidores estrangeiros é outro ponto que vai pesar contra a atração de grupos de fora. “O governo não endereçou essa questão e isso deve desestimular a vinda de estrangeiros.”

Ainda assim, as empresas seguem avaliando. “Estamos olhando, temos interesse e queremos fechar ainda neste ano um consórcio”, afirma Bruno Sena, presidente da Barbosa Mello Participações e Investimentos. O grupo mantém três conversas paralelas para, “se for viável”, diz, ir às compras. Neste caso, há dois modelos para ir ao leilão: com um grande parceiro operador ou com grande parceiro operador mais um fundo. A CCR, que também já declarou interesse nos aeroportos, disse, por meio de nota, que “está interessada e estudando os editais”.

Fonte: Valor

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